Poética 42
Era uma menina
vestida de outubro
atravessando a rua
com um girassol no vestido
suas mãos beijavam o vento
como fossem beija-flor
meus olhos mergulhados
na paisagem
entre os olhos da menina
e o espelho do retrovisor
foto.grafei naquela tarde
o branco do vestido
e o girassol daquele dia
para me habitarem
seja lá por onde eu for
Federico Baudelaire
,
furai
a pele das partículas dos poemas
viemos das gerações neoabstratas
assistindo a belos filmes de Godart
inertes em películas de Truffaut
bebendo apocalipses de Fellini
em tropicâncer genocidas de terror
, sangrai a tela realista dos cinemas
na pele experimental do caos urbano,
tragai
Dali pele entre/ossos
Glauber rugindo enTridentes
na língua do veneno o gozo das serpentes
nos frascos insensíveis de isopor
,
caímos no poder do vil orgânico
entramos no curral dos artefatos
na porta de entrada os artifícios
na jaula sem saída os mesmos pratos
Artur Gomes
www.fulinaimagens.blogspot.com
FILHO TEU
PAI VOLTOU DA LUTA
Filho, eram onze da manhã
quando avistei teu pai
entrando na nossa rua.
As portas, as janelas, das casas, se
abriram como se por ali
um grandioso cortejo passasse.
Havia tanto silêncio e ecos de silêncio
entrando em outros ecos
formando outros silêncios.
E ele caminhava como se uma perna
machucada se encontrasse.
Na nossa porta, abraçou-me
e disse-me bom dia.
Trouxe meia dúzia de roupas sujas,
envelhecidas, e um porco.
Um filhote de porco, filho.
Sentou na cadeira em que agora tu estás
banhou-se, comeu,
pediu-me chá verde com hortelã
bem quente com raspas de limão
falou da violência da luta,
dos rios que atravessou,
das aves que matou
para afastar sua fome
e dormiu profundamente.
Tomou o café da manhã.
Ovos mexidos, pão, que eu mesma fiz,
mamão e banana.
E saiu.
Faz três dias, filho.
Nenhuma notícia chega.
Há no quintal, um porco,
um filhote de porco,
que mal conheço
e não sei cuidar.
Ele talvez agrida os patos e
as galinhas e receio que coma
as cenouras as folhas de alface,
os tomates, as beterrabas
que crescem na horta.
É preciso que tires o porco,
da nossa casa, filho.
Não gosto de porco.
Nunca gostei de porco.
A jugular, corte-lhe
se sentir necessidade.
Estou com muita tristeza, filho.
Muita tristeza.
O dia está quente. Não há
ventania, nem chuva.
Já não há mais luta, filho.
Celso de
Alencar
poema para o próximo livro
VIVER É UM VENTO
SOPRANDO CADA VEZ
MAIS FORTE
Qualquer solidão é mais densa
que um amontoado de mágoas.
Coleção de símbolos na estante.
Volume menor, muito menor
na memória.
É o caminho que se desenha
sem volta. Comunhão de meias
palavras.
Todas cravadas no silêncio.
Respiro no hálito do caminho.
Para romper dissonâncias e
dobrados com quietudes
inquietas.
O prazer é o prazer. O resto
é o que nos distrai na moldura
de cada alegria.
Já a tristeza,
essa légua e pouco de gelo
e chama que derrete e apaga
com o beijo do nunca mais.
Essa égua insana
sempre no cio...
A tristeza é um desvio.
Não, não.
É um pavio.
Mas, só o amor que destrava
as represas. Inunda sem afogar.
Amar é um tipo de êxtase de
ação prolongada.
Mergulho no cânion dos
sentimentos extremos.
Por isso, não raro, pergunto
a mim mesmo em que rigidez
guardei minha ternura.
Ainda caminho por aí...
Sandálias raspando o asfalto.
Os pés metidos no mangue.
Coração no ritmo
do sangue.
Até que tudo estanque.
Lau Siqueira
Jura Secreta 35
palmeira subindo a maralha
punhal trincheira na trilha
cortando o pano a navalha
Artur Gomes
do livro Juras Secretas
Editora Penalux – 2018
www.secretasjuras.blogspot.com
clic no link para ver o vídeo
Pontal Foto Grafia
https://www.youtube.com/watch?v=KHkDP2IVTAg
poema1
Sobre
a tessitura do existir,
o
que se pode dizer
de
Amor?
Do
ser capaz
de
manejar o todo o dia,
(cada
coisa no seu lugar),
e
de se ser apenas
a
própria pessoa
sem
se diluir nos outros,
e,
ao mesmo tempo, recebê-los
com
a naturalidade da posse de um braço,
ou
de seu próprio cabelo,
como
poder?
E
do arcar com a surpresa
da
manhã que nasce
e
que me coloca diante do fato
de
estar viva
e
de ser mulher?
E
das consequências desta realidade
que
eu nem pedi,
que
me foi dada como um presente,
(sob
o papel a caixa de surpresas),
o
que se pode dizer?
E
por que a mim coube esta
e
não outra posse,
como
ser árvore
rio,
flor
ou
asa?
Perplexamente
reconheço
Que
mais nada me seria dado.
Nada
mais saberia ser, eu,
que
já nem sei nada
e
tanto me custa aprender
aquilo
que sou.
É
difícil ser e há momentos
em
que o definir-se,
o
estar sendo aquele momento
é
como um sonho
e
o estranho
é
a gente se encontrar na gente mesma
limitada
em corpo ancho,
entre
nascimento e morte
limitada.
(em “Do íntimo
dizer”)
Interpretado por
Thereza Cristina Cruz, este poema foi o vencedor do FesTribuna Livre de Poesia
Falada, Festival criado por Artur Gomes para o Bar Tribuna Livre em Campos dos
Goytacazes – 1997 – a grande final foi realizada no Bar Boca de Luar, em Grussaí
– no verão de 1998.
www.fulinaimacentrodearte.blogspot.com
Fulinaíma MultiProjetos
Nenhum comentário:
Postar um comentário